domingo, 21 de setembro de 2008

Homenagem Ao Meu Padrinho

Assim que cheguei em Timor, fiquei 15 dias na capital, Dilih, e logo me mudei pra Maliana, um distrito no interior do pais, para ensinar portugues numa capacitacao realizada pelo governo brasileiro. O colegio catolico que eu trabalhava estava isolado numa das milhares montanhas do Timor, para chegar a cidade mais perto tinha que andar 1 hora a peh. A vida nos distritos de Timor eh muito diferente da vida na capital, lah eu tomava banho de caneca, energia somente quatro horas por dia, das 18 horas as 22 horas, e internet nem se fala. A minha rotina era basicamente acordar cedo trabalhas das oito horas ate o meio dia, fazer a sexta, e trabalhar das duas horas as quatro da tarde. Durante o tempo livre eu ficava conversando com as mulheres timorenses que trabalhavam na cozinha e brincando com as criancas delas, acredito que assim eh a melhor forma de entender a cultura e o povo daqui.
Num dia desses, lah pelas 5 horas, como de praxe, fui brincar com as criancas, quando escureceu decidi voltar pra casa - quando se vive sem energia, eh o sol que determina seus horarios: foi bom viver segundo as ordens do sol. Nesse dia em particular, as criancas fizeram um roda em volta de mim e comecaram a rezar Ave Maria, embora eu nao seja catolica e tenha milhares de criticas a insercao do cristianismo na cultura timorense, aceitei a reza delas como um presente; na hora eu interpretei aquilo como uma tentativa de se comunicarem comigo de uma forma que eu entendesse, pois todas falavam muito pouco em portugues e eu tinha o tempo todo em que estava com elas fazer um esforco gigantesco para entender o tetum.
Quando cheguei em casa liguei para minha mae e ela me disse que meu padrinho havia falecido, fiquei triste, claro, mas tive a sensacao de que tudo que eu pude aproveitar dele eu aproveitei, que a minha relacao com ele foi muito bonita. Enquanto eu estava no meu quarto isolada pensando na triste noticia, eu me lembrei das criancas rezando em volta de mim, parecia que foi uma preparacao para a noticia triste; ai realmente eu me dei conta de como era bonita mesmo a minha relacao com meu padrinho, quando soube da sua morte de certa forma teve algo especial. (Quando eu era adolescente, um grande amigo meu, Alison, morreu num acidente de carro, foi a minha primeira grande perda, que eu realmente senti uma dor "de saudade que ia ser pra sempre". Uma grande amiga no meio da minha tristeza me disse para eu rezar uma Ave Maria, sempre que eu me lembrasse dele e de todas as pessoas que eu gostava, que nao estivessem mais aqui. Enquanto fui catolica, sempre rezava uma Ave Maria para meu amigo.) Nesse momento tambem senti um medo e um profundo, a mesma sensacao que eu sentia quando era muito catolica durante as minhas oracoes. Confesso que por fracoes de segundo pensei ser o momento de uma reconversao ao catolicismo, mas jah passou.
Fica aqui a escrita, com todas as minhas crencas filosoficas que tenho nela, para homenagear meu padrinho, ja que aqui eh tudo tao distante.

2 comentários:

Anna Carol disse...

Isa, que lindo! Apesar das críticas ao catolicismo, a comunhão entre as pessoas é algo inegável (e mágico demais!). Fique tranqüila, querida. Ele se foi, mas agora está mais perto do que nunca de você.

Beijos e muitas saudades

Natalie disse...

Tomótes!
Que bom receber notícias suas! Que triste a gente também receber notícias ruins!
Muito mágico o que passou com você! Que crianças sensíveis, e como apesar da não religião, tem um pouco de Deus em tudo.
Eu também recebi uma notícia das bravas, um amigo querido da minha turma está bem doente.
Mas domingo veio a notícia que tem chances, e essa semana começa a quimio!
Já lhe disse, e repito, estamos longe, mas sempre um pouco perto!
Beijo grande