terça-feira, 21 de outubro de 2008

Sexo

Vamos falar de sexo, tetum e bahasa, um assunto picante para linguistas!
(Senta que lah vem historia)
Semana passada eu estava andando na rua, calma e tranquilamente, quando juntou em volta de mim um monte de timorenses, desse que vc olha e pensa: "Tem 12 anos", mas no final das contas tem eh 16, 17 anos. Enfim, como se nao bastasse ficar em volta de mim eles ficavam falando: "Malae jiggy-jig!" ( ah, se le zig-zig). Eu saquei que coisa boa nao era e comecei olhar com uma cara muito feia pra eles, ai um deles decidiu tomar coragem e passou a mao na minha bunda! Sim, eh a segunda vez que passo por isso, a construcao da sexualidade aqui eh uma loucura, tema pra uma postagem longa, mas no momento falemos soh de sacanagem, rs! Ai eu fiz mais cara de brava ainda e ameacei correr atras dele, quando acelerei o passo o menino comecou a correr de mim e, por pouco, eu nao passei carao... Imagina, eu soh dei uma ameacada nele, se eu chegasse perto dele eu num ia bater nem fazer nada, afinal tds timorenses super se comunicam e eu podia ser alvo de alguma retaliacao. Mas me senti a Mulher, quando eh que na minha vida um cara ia passar a mao na minha bunda e depois fugir de mim?
Agora a parte divertida para linguistas, as palavras que significam sexo em tetum e bahasa sao muito divertidas, eh uma especie de "nhanha" do Brasil. Olha soh: jiggy-jig e taka-taka, sao as palavras usadas para designar sexo, respetivamente, em bahasa e tetum.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Dicionário e gramática de sensações

Pequena coleção de palavras bonitas
-presente pra quem gosta de sentir pra se estranhar-

lian - língua
fuan- coração
liafuan -palavra, em segredo, palavras do coração

ko´a- cortar
lian - língua
ko´alia- falar, mais um segredo, língua cortada

tassi- mar
ibum- boca
tassi ibum- praia, nem te conto que isso é a boca do mar

Para se formar o presente
Sujeito+ partícula sei+ verbo + partícula namanas
namanas vem de manas que significa quente.
O que está presente, que é o agora é aquilo que está quente, que está vivo, que tem calor, que tem vida.

Terremotos

Barulhos
Aqui quando a terra treme
ouve barulhos de latas,
ritmados, não pensados e ritualizados:
o deus está bravo, precisa acalmá-lo,
com a mesma força da sua raiva.

Quando tem terremotos aqui, as pessoas saem na rua batendo panela conforme o culto das religiões tradicionais do Timor. Na verdade tentei falar em prosa, mas me emocionei tanto e achei tão bonito esse costume que virou poesia pra dizer muito mais coisas.

Pedras

Há uma guerra triste e silenciosa aqui, sem muitas armas, não porque não queiram, mas porque não podem. É fato, os timorenses não nos querem aqui, nós estrangeiros não somos bem vindos, mas somos necessários para a economia, apenas. Pois, no mais nós os agredimos sutilmente todo o tempo: impondo os nossos hábitos sobre a sua cultura por termos mais dinheiro; muitos que vêem pra cá é só pelo dinheiro, pensam pouco no que podem fazer por aqui; e outros que pra cá vêem, embora não pensem em dinheiro, pensam em uma experiência individual – nesse momento eu assumo a minha posição, tenho realmente uma descrença muito grande de que vou construir o país, há interesses muito maiores que me deixam de mãos atadas.
Quando ando na rua aqui, vejo os malae* andando de carro com ar condicionado, com roupas bonitas compradas nas viagens pela Ásia, com perfumes comprados em duty free, com câmeras digitais para registrar o estranho e talvez exercitar um pouco da sua subjetividade (me assumo, novamente), deitados na praia, aproveitando a ilha paradisíaca, com as cangas compradas em Bali e usando biquiní, morando nos hotéis, tendo acesso a energia todo o tempo, mesmo quando toda a cidade está escura, tendo água bem tratada e dinheiro pra comprar a água importada da Indonésia, ocupando cargos importantes em organizações e ganhando 50 vezes mais que um timorense ( meu salário é quase 7 vezes o de um ministro e a cooperaçõa brasileira é a que paga menos), insistindo em falar ingles o tempo todo, rindo da praticidade e simplicidade da língua tetum, reclamando do mau cheiro daqui e das pessoas daqui e, frequentemente, justificando tudo que não satisfaz aos malae com o argumento “ainda não são civilizados”.
Aos timorense convém bicicletas, para alguns ainda motos, roupas compradas por 0,25 nas feiras que vendem as doações vindas da Europa, assistir e dar aulas perto de esgotos, ir a praia para vender banana e bugingangas e serem xingados pelos malae como inconvenientes, todo o tempo aparecer na nossa frente e em todo lugar oferecendo pulsa, crédito para telefone, vender águas e energéticos na rua, trabalhar para um chinês qualquer dono dos negócios de um quarteirão inteiro, transpirar embaixo de um sol absurdamente quente, ferver, quando dá e quando tem acesso ao conhecimento de práticas de higiene, a água para beber, falar em tetum, bahasa ou qualquer dialeto para não serem compreendidos, sofrer um processo de aprendizado agressivo de uma nova língua, entrar no mar de roupa, mas não muito perto da área dos malae, e se admirarem, com um certo ressentimento, com a vida que o resto do mundo diz ter.
Ontem a noite eu estava voltando pra casa de bicicleta, ouvi uns barulhos estranho e quando me dei conta, os timorenses estavam jogando pedras em mim e em mais dois professores da cooperação brasileira. Comecei a correr com a bike pra não levar nenhuma pedrada e consegui fugir de todas, sai ilesa. É comum eles jogarem pedras nos malae quando a raiva transborda, e não é nenhum transtorno. Aqui não se vê casais de namorados se beijando na rua, os timorenses, por um resquiço católico e puritano não aceitam isso, se sentem profundamente ofendidos e jogam pedra quando isso acontece.
Os barulhos das pedras no portão de metal ainda ecoam em mim.
* Malae é uma palavra de origem indonésia que primeiro designava somente os indonésios que eram estrangeiros na época da ditadura, mas hoje designa todos os estrangeiros, seria o nosso gringo, mas usado com muita frequência.
O texto foi escrito dia 6 de outubro e como de praxe as postagem é tradia

domingo, 5 de outubro de 2008

Primeiras impressões, já tardias

Como não tive tempo no início dos meus tempos aqui, tento agora passar as minhas primeiras impressões, é claro que nesse momento se trata de enésimas impressões. Quando cheguei senti o povo timorense super receptivo, eu passava na rua e eles sempre sorrindo pra mim e algo que eu me perguntava o tempo todo era: “Até quando isso vai durar?” É inacreditavel que se possa passar um ano em um lugar e as pessoas sorrindo o tempo todo pra voce. Uma segunda coisa que me tocou bastante, e que é natural e esperado, foi a língua, “Meu Deus!”, quando ouvia as pessoas passando perto de mim e conversando, eu achava aqueles sons estranhos, uma melodia diferente, um ritmo desconhecido, mas não por completo, pois ora ou outra saia uma palavra em portugues, pois como já disse, a língua tetum é uma mistura dos dialetos daqui, do bahasa indonésio e do portugues. A primeiroa vez que fui ao supermercado foi horrível, foi tudo intenso demais, eu queria comprar as coisas mas não conseguia entender o que estava escrito. Embora seja comum ter produtos que tambem vendem no Ocidente de grandes marcas – que todos conhecem, mas não cito pra não fazer publicidade-, as especificações como para qual tipo de cabelo, de pele nao era possível entender. No final das contas, senti uma tonteira e falta de ar! Voltei pra pousada que eu estava morando e tive aqueles segundos de uma crise existencial profundo que parencem uma eternidade. Na verdade eu senti um medo gigantesco de ter que começar tudo de novo na minha vida, novos amigos, novos lugares, novos amores e novas línguas. E onde ia ficar o espaço pra eu ser que eu era habituada a ser? Mas depois como tudo, “já passou, já passou...”
E como essa dobradura toda se desdobrou? Na verdade quem sorria o tempo todo era eu, os timorenses cumprimentam nós estrangeiros, mas não tanto como eu pensava. Compreendi isso melhor depois de estudar, viver e ler um pouco da historia daqui. Um povo que viveu tanto tempo em guerra , não iria ser tão passivo e tão tolo; um povo que venceu uma guerra contra a Indonésia, essa apoiada pelos EUA e pela Austrália, usando apenas pedras e catanas – uma faca grande típica daqui- não iria ser tão pacífico e ingênuo. Na verdade essa recepção toda é pra saber quem é o estrangeiro, o que ele quer, em que medida está invadindo e mudando a cultura daqui, enfim, uma tática de guerrilha que eles estão tão habituados. É incrível a rede de comunicação que há entre eles, mal eu mudei para a minha atual casa e no dia seguinte todos os timorenses na rua me chamavam de professora, falavam “Brasil!”, sabiam várias coisas da minha vida! E além de tudo, não é um povo tão receptivo assim, quando eles notam que os estrangeiros sabem um pouco de tetum, começam a falar em bahasa, e se notam que os etrangeiros falam bahasa, começam a falar num dialeto qualquer deles e o pior, sorrindo. O tempo que eu morei em Maliana me fez ver isso, durante as auals eles me botavam à prova o tempo todo, queriam de um jeito ou de outro mostrar que eu não sabia português, e usavam argumentos baseados no português de Portugal. O que me impressiona é usar argumentos que perpetuam a idéia de colônia, que não respeita a identidade deles de como um povo que busca e afirma a sua identidade, para afirmarem a sua identidade e independência. Confesso que isso às vezes me tira do sério, mas faz parte do pacote. Quanto aos sons estou me habituando com a melodia daqui, ouço timorenses conversando, embora não compreenda bem tetum ainda, não acho os sons tão estranhos. Quanto as idas aos supermercados, encontrei a solução: há dois ou três supermercados próprios para malai, ou seja, estrangeiros, lá está tudo em inglês! E sobre a crise existêncial, quando penso onde estou, a distância que é e como isso tudo parecia impossível pra mim, começo a entender o sentimento de algumas pessoas que o mundo seja pequeno, mas nem por isso menos fascinante e estranho, na qualidade mesmo de poder sempre ser estrangeira.
Ah, uma observação, tenho um cotidiano tranquilo, mas frequentemente tenho pesadelos, acho que é essa sensação de paz fugitiva, de ecos de guerra e de improviso, nada aqui é estável.
3 de outubro de 2008

Bafão

Esse meu blog estah muito serio, vou anima-lo um pouco. Eis a historia do meu barraco no Timor Leste. Quem me conhece, sabe que eu nao curto muito barracos, baixarias e este tipo de coisa, mas teve um dia aqui numa balada que eu dei o barraco, e como todos ficam sabendo de tudo aqui no Timor Leste, o barraco ganhou uma proporcao internacional! No mes de setembro os professores brasileiros da CAPES organizaram uma festa brasileira a beira mar, de brasileira nao tinha muita coisa, pois so tinha pessoas de outras nacionalidades e soh se ouvia musica internacional. Um pequena observacao das musicas que rolam aqui, como tem gente de todo mundo, nas baladas roalm musica indiana, africana, principalmente o ritmo kizomba, americana, portuguesa (que eh pessima), timorense, e todos aqueles classicos da decada de 90! A muscia brasileira que rola aqui eh aquele esquema Ivete Sangalo, Babado Novo, mas para surpresa geral o grande sucesso aqui eh Amado Batista, os timorenses amam as muscias dele. Tambem tem outras coisas bizarras, outro dia liguei a TV, que convenhamos, eh uma experiencia assistir TV aqui, e tinha uma menina indonesia, com 1kg de poh branco na cara cantando em uma afinacao bizarra a musica "A Lenda" de Sandy e Junior. Desculpa pelos meandros, mas eu precisava falar desses ineditismos!Em um determinado momento da festa, depois de uma tequilinha decidi fazer aquelas coisas bem brocolis, colocar o pe dentro do mar e ficar ali olhando aquela imensidao linda de madrugada contrastada com o barulho da festa e tal, essas coisas de bebada ah sensivel! Quando eu estava voltando, um policial portugues que eu naum conhecia me pega a forca e me joga no mar, eu tinha falado com ele que nao queria ser jogada, mas ele usou da forca pra isso. (Mais uma contextualizacao, aqui ha varias forcas armadas, tem a australiana, que eh a mais agressiva pois anda com armas grandes, comeca a agressao pela estetica, a da Nova Zelandia, que tem o simbolo de um passarinho chamado kiwi, a ONU, que faz disso daqui a torre de babel e por fim a GNR, que eh uma policia portuguesa que tem fama de ser muito agressiva. Na real acontece o seguinte, os jovens militares que nao tem trampo em Portugal sao mandados pra cah, muitos deles sao muito jovens e abusam do poder ao manter a relacao metropole e colonia, principalmente no que se refere as mulheres timorenses. Os timorenses de uns meses pra ca tem tomado uma postura muito agressiva com a GNR por acharem que as mulheres sao desrespeitadas por eles. Eh comum os policias da GNR tambem terem esse tipo de postura com as brasileiras, porque nao eh segredo pra ninguem a fama de puta que nos brasileiras temos e a imbecilidade que rege a mente dos machistas. Como brasileira a gente tem que o tempo todo manter uma postura pra nao passar essa imagem e ser respeitada, eh uma luta diaria aqui.) Esse policial que me jogou era da GNR, mas eu nao sabia ,e na hora tambem nao me dei conta de saber nada, eu fiquei tao brava que xinguei o cara ateh a bisavo dele, ainda dei um pedala nele quando estava no meio do mar e sai xingando ele, falei que nao tinha o direito de encostar em mim sem o meu consentimento e usar da forca pra isso e , claro, usei o meu repertorio de palavrao. O portugues ficou com uma cara de besta dentro d'agua e sem reacao, acho que ele num esperava uma bomba como eu! Em uma outra balada estava conversando com um portugues e ele disse que era da GNR, eu pra la de baguidah perguntei " Voce conhece o imbecil que me jogou na agua?", ele ficou surpreso de saber que eu era a menina e eu fiquei supresa de saber que ele jah sabia, no final das contas o quartel inteiro ficou sabendo do acontecido e todo mundo tira um sarro desse cara. Ele me disse tambem que o tal portugues tinha fama de chato e incoveniente, e que foi bom alguem coloca-lo no lugar dele. Para um barraco, eu acho que me sai bem!
Ah, essa foi postada dia 5 de outubro, mas a escrevi 26 de setembro